Ultimamente, tenho relembrado de uma iniciativa que tive em conjunto com alguns amigos em 2011. Iniciamos o grupo Mão na Praça, com intuito de ocupar e revitalizar praças públicas de São Paulo.
Gostaria de republicar aqui uma história de um senhor que vive em Pinheiros e conheci muito ao acaso. A história é sobre sua dedicação a uma pequena área verde próxima de seu estabelecimento e da repercussão que a alteração e o cuidado com o ambiente físico pode trazer ao ambiente espiritual, por assim dizer… (Quero falar mais sobre esse assunto em breve.)
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O TEXTO ABAIXO FOI ESCRITO E PUBLICADO EM 17/05/2011 NO BLOG DO MOVIMENTO MÃO NA PRAÇA.
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Desde março, de segunda a quinta-feira, percorro a pé o bairro de Pinheiros após o trabalho, da rua Simpatia, na Vila Madalena, até a avenida Rebouças, onde faço um curso. O trajeto dura aproximadamente 35 minutos.
Mudo o itinerário do meu percurso a cada dia, assim aproveito para conhecer novas ruas e diferentes lugares. Um desses itinerários se faz passando por um quarteirão da rua Henrique Schaumann, entre a Cardeal Arcoverde e a Teodoro Sampaio.
Exatamente nesse pedacinho super movimentado e barulhento (devido à enorme quantidade de carros e ônibus) reparei em uma pequena área arborizada, porém suja e isolada do público por um gradil. Há um ponto de ônibus bem em frente, geralmente com algumas pessoas sentadas e outras em pé.
Por alguns dias, ao passar em frente a essa área gradeada, fiquei pensando no porquê de se trancar um espaço público de terra e com árvores, e deixá-lo abandonado. Cheguei a imaginar a área revitalizada e no bem que ela faria a quem passa por ali ou fica por um longo período esperando o ônibus chegar. Afinal, quem é que não gosta de ficar um tempo sentado num banco confortável sob as árvores lendo, conversando ou apenas dando uma pausa na correria do dia a dia?
Além do mais, em uma cidade como São Paulo, espaços verdes bem cuidados estão em falta. Manter uma área como essa trancada e suja é desperdiçar espaço de lazer e demonstra pouca consideração com os cidadãos, que poderiam estar se beneficiando de um ambiente mais tranquilo.
… os dias passam…
Numa dessas “mudanças de itinerário” conheço um morador da região. Conversando sobre assuntos ligados ao Paisagismo e à relação do Homem com o espaço natural, chegamos no assunto praças públicas. Por um grande acaso, ele me conta que a praça em questão (da Henrique Schaumann) já fora adotada alguns anos atrás por um senhor chamado Alberico Rodrigues, dono de um Espaço Cultural que leva seu nome (localizado numa das praças mais famosas de São Paulo, a Benedito Calixto).
A história que vou contar pra vocês não tem um final muito feliz. Mas, como a vida sempre continua, pode ser que as coisas mudem…
Tudo começa quando o professor de Literatura, Alberico Rodrigues – já cansado de ver a pequena área “verde” da Henrique Schaumman muito suja, acumulando entulho e sem uso pela população – resolve assinar um Termo de Cooperação* com a Subprefeitura de Pinheiros, em 1996, para adotar a pracinha.
O acordo foi formalizado e o professor obteve autorização para cuidar da área. A partir de então, retirou todo o entulho, plantou novas mudas, instalou bancos e até mesmo encomendou esculturas com o busto de Homero e Camões – dois renomados poetas – especialmente para a praça. Sob aprovação da Subprefeitura de Pinheiros (registrada no Termo de Cooperação) abriu uma entrada nos fundos do Espaço Cultural, permitindo acesso ao seu estabelecimento pela praça.
O local ficou conhecido como “Jardim Cultural” e tornou-se ponto de encontro de artistas, estudantes e atores, que lá costumavam apresentar saraus literários.
Os portões do jardim eram abertos todas as manhãs para uso livre e fechados ao anoitecer.
Tudo corria bem, até que em 2001 (às vésperas de completar 5 anos de adoção daquele espaço), o professor foi surpreendido com uma intimação da subprefeitura, solicitando que retirasse tudo o que tinha instalado na praça em até 48 horas e que fechasse a porta de acesso ao seu Espaço Cultural, sob acusação de estar utilizando a área pública irregularmente, como chamariz ao seu estabelecimento.
Alberico prontamente cumpriu as ordens da prefeitura mas ficou inconformado com a acusação, já que a abertura da porta de acesso ao seu Espaço Cultural fazia parte do acordo assinado com a Subprefeitura de Pinheiros.
Moradores, comerciantes e empresários do bairro, revoltados com o fim do “Jardim Cultural”, mobilizaram-se e entregaram cerca de 10 mil assinaturas à subprefeitura, pedindo que voltassem atrás na decisão.
O fato foi manchete em vários jornais (Jornal da Tarde, Gazeta de Pinheiros), mas não houve mais acordo e a área permanece até hoje fechada às pessoas que por ali passam, sem a devida manutenção e com lixo acumulando.
Resolvi contar essa história real pois me senti triste ao saber do descaso que a subprefeitura teve (e está tendo) com este espaço público, ao preferir mantê-lo inacessível aos cidadãos e sem a devida manutenção regular, contrastando radicalmente com o que um dia foi: espaço de convivência de várias pessoas e de trocas culturais.
O mínimo que poderiam ter feito ao cancelar o termo de adoção teria sido reabrir o espaço e cuidar tão bem quanto o professor cuidou. Ou talvez renegociar o Termo com outra sugestão para a questão do acesso ao Espaço Cultural.
Quem saiu perdendo com isso? Infelizmente todos que passam por lá e poderiam ter um espaço agradável para dar uma pausa no dia a dia corrido de São Paulo.
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